Friday, 30 May 2014

WSJ:Safra de soja argentina alivia governo, mas não os produtores

"Agricultores em toda a Argentina vêm batalhando contra o governo populista da presidente Cristina Kirchner há anos.
Agora, a safra recorde de soja produzida por eles está ajudando a sustentar seu oponente, gerando reservas internacionais essenciais para que o governo de Kirchner evite outra crise cambial. O Banco Central do país informou esta semana que a safra contribuiria para manter o atual nível de reservas de US$ 28 bilhões até o fim do ano.
Os agricultores veem a situação com ironia. "Um em cada três caminhões carregados vai direto para o governo", diz Carlos Bunge, agricultor e descendente da família que fundou uma das maiores empresas de comércio de grãos do mundo 130 anos atrás. "Você se sente como se estivesse alimentando um monstro."
Com a colheita em pleno andamento até julho, os embarques de soja já geraram mais de US$ 8 bilhões e devem atingir um recorde de US$ 29 bilhões, segundo informações oficiais e projeções de analistas. A soja, o grão mais lucrativo da Argentina, é responsável por quase um terço da receita com exportação do país.
Para a Argentina, o dinheiro não poderia vir em melhor hora, já que o país enfrenta uma desaceleração, uma inflação que é a segunda maior da América Latina, só atrás da Venezuela, e uma escassez aguda de reservas estrangeiras, com pouco acesso aos mercados financeiros internacionais desde a moratória de 2001.
O governo de Kirchner tem pressionado os agricultores a vender rapidamente a safra — contra a vontade deles — para ajudar o país a evitar uma repetição da prejudicial desvalorização do peso em janeiro. Recentemente, o chefe de gabinete Jorge Capitanich convocou os principais exportadores de grãos à Casa Rosada para reforçar o pedido".
"Há boas perspectivas para este trimestre, com preços muito bons", disse Capitanich a repórteres depois da reunião. "Isso significa entrada de recursos e novos empregos."
Mas os produtores — que dizem sofrer com impostos e regulação excessiva — estão resistindo. Eles estão vendendo parte da safra para pagar dívidas depois que o governo acabou com os empréstimos subsidiados para os agricultores este ano. Os produtores dizem que querem reter o restante da produção como uma forma de se proteger contra a inflação e contra o enfraquecimento do peso, além de lucrar com os maiores preços da entressafra.
"Grão é como dinheiro embaixo do colchão", diz o agricultor Francisco Santillan, que administra 2.266 hectares na zona rural de Pergamino. "Nós não usamos bancos. Usamos silos."
Pergamino, a cerca de 240 quilômetros de Buenos Aires, é uma cidade pacata e conservadora com 100.000 habitantes, rodeada por enormes e prósperas fazendas do rico cinturão agrícola argentino. Mas a calma aparente esconde um temperamento rebelde que remonta ao século XVII, quando Pergamino costumava ser uma parada de uma rota clandestina de bens contrabandeados para burlar as restrições comerciais da Espanha.
Em 2008, quando o predecessor de Cristina, seu marido Néstor Kirchner, já falecido, tentou elevar o imposto de exportação para a soja de 35% para uma taxa flutuante que chegava a 50%, os produtores da região se revoltaram, paralisando as vendas de grãos e bovinos e bloqueando as estradas. O Congresso argentino então não aprovou o novo imposto.

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